Tatiana Milanez é Pedagoga formada pelo Instituto Sumaré de Educação Superior – Centro Universitário Sumaré, Pós Graduada em Educação Especial com ênfase em Surdez pela Faculdade Presbiteriana Mackenzie e Agente Bi Cultural – Tradutora, Intérprete e Instrutora de Língua Brasileira de Sinais - Libras pelo grupo educacional da Universidade Internacional - UNINTER. Atualmente cursa Pós Graduação de Tradução e Interpretação pelo Instituto Singularidades.
Na infância, ela recebeu de presente um irmão surdo, o que influenciou o percurso de sua vida, pois decidiu estudar e lutar pelos direitos de seu irmão e de todos os surdos.
É atuante na Comunidade Surda há muitos anos. Desde criança, possui o sonho de difundir a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) para que todos possam se comunicar com seu irmão e os demais surdos do país. Luta e propaga incessantemente esta Língua e, por meio deste trabalho, deseja abarcar um grande número de pessoas para esta causa.
Sua missão é disseminar com qualidade esta maravilhosa Língua e a Cultura desta Comunidade que tem muito a oferecer a todos nós.
1° Tatiana, conte para nós o que te motivou a ser uma das melhores profissionais na área da Língua de sinais, o que te moveu para essa profissão?
Sempre digo que fui escolhida, tenho muito orgulho, sinto que meus caminhos me moveram para esta área e sou muito feliz por atuar nela.
Por mais contraditório que possa parecer, minha motivação foi a “exclusão” e as experiências negativas que vivi desde os meus sete anos de idade, quando recebi meu grande presente, meu irmão Vladimar “Vladi”.
Sempre tive dificuldades para entender o motivo das pessoas se portarem com tantos sentimentos ruins em relação ao meu irmão e a todas as pessoas com deficiência.
Lembro-me de momentos muito difíceis que passamos, meu irmão sofreu demais e eu sempre estive em sua defesa, mas na sua adolescência tive um chamado, quando ele descobriu que tinha surdez, senti que precisava fazer algo para mudar nossa história. A partir de então, dedico a minha vida aos estudos da Língua Brasileira de Sinais e tudo que envolve esta área.
2° Qual o momento mais complicado que você teve nessa trajetória?
Já passei por muitas experiências difíceis, mas para mim não tem nada pior do que presenciar uma pessoa com deficiência sendo maltratada, humilhada, enganada e deixada de lado por causa da sua condição.
E esse sentimento se multiplica no caso da surdez, pois a falta de comunicação acarreta inúmeras questões.
Lidamos com pessoas que infelizmente são estrangeiras dentro do seu próprio país, por isso, a minha luta em relação a propagação da Libras.
Recentemente tive contato com uma situação que me abalou bastante, pois se perceber alguém sendo diminuído por causa da sua condição já é difícil, imagina descobrir pessoas com a mesma condição se aproveitando para extorquir.
3° Seu irmão teve dificuldades para ser incluído no setor Educacional e na sociedade posteriormente?
Sim, infelizmente são muitas histórias de exclusão. Há alguns anos atrás tínhamos que praticamente nos esconder para não sofrer preconceito.
Quantas vezes precisei intervir e “livrar” meu irmão de alguma situação.
Imagine você que existiam até os que se achavam no direito de bater nele só por ele ser surdo.
Em relação ao tempo de escolarização, ele conta muitas histórias de professores que davam aula de costas escrevendo na lousa e ele simplesmente não entendia nada por não ter acessado a explicação.
Foram anos dentro da escola, porém, não fazendo parte da escola.
Tudo isso é muito difícil de lembrar...
Na rua que nós morávamos as crianças o chamavam de apelidos ruins e o maltratavam bastante.
Lembro-me de sair correndo atrás deles exigindo que parassem de maltratá-lo.
Com tantos empecilhos a vida em sociedade não era tão fácil, mas com o passar dos anos esta luta colheu seus resultados e hoje o Vladi é um rapaz que só me enche de orgulho.
4° O quanto a família pode ajudar e contribuir para o desenvolvimento de uma pessoa com Deficiência?
É primordial que a família acredite no potencial de cada indivíduo, acredite que todos são capazes e que cada um pode desempenhar o seu papel de acordo com as suas características e possibilidades.
É preciso sobretudo que desfaçam o modelo de indivíduo que a sociedade desenhou e cobra tanto.
Sempre digo para as famílias que acompanho que todos nós somos “perfeitos”, independente da condição de possuir uma deficiência ou não, pois somos frutos da perfeição e dela somos imagem e semelhança.
5° Qual o passo a passo para uma família ao notar que a criança tem Deficiência auditiva ou surdez?? O que eles devem fazer ou qual caminhos devem buscar?
A criança com estes comprometimentos não responderá aos estímulos sonoros, é importante ficarem atentos.
6° Você como especialista em interpretação da língua brasileira de sinais, qual sua opinião sobre inclusão Educacional? Estamos preparados para receber alunos com surdez?
Acredito de uma maneira geral que nós Seres Humanos não estamos preparados para lidar com as diferenças, mas acredito também que temos um poder incrível de adaptação e mudança.
Há alguns anos atrás, como mencionei acima, a Comunidade Surda vivia em um mundo paralelo e hoje temos a oportunidade impar de estarmos juntos em um mesmo espaço.
A questão aí na verdade é fazer com que os profissionais de Educação entendam que não precisamos de “formação” para exercer a humanidade, mas precisamos de empatia e esforço para atender a cada um conforme suas especificidades.
No caso dos estudantes com surdez temos vários apoios dentro das Unidades Educacionais que são previstos em legislação.
Infelizmente a falta de conhecimento das legislações e a falta do olhar humanizado para com todas as diferenças acarretam no senso comum de que práticas satisfatórias não acontecem.
7° Se você pudesse mudar algo na sociedade atual, qual seria o seu desejo?
Sonho com uma sociedade que respeite as diferenças e deixe de lado as visões capacitistas e excludentes.
Vou continuar lutando...
8° Para finalizar, queremos que você relate um momento especial que vivenciou na sua profissão até aqui, algo que te emocionou e mexeu com você.
Ah! Que pergunta mais linda!!
Já recebi vários presentes, mas o maior deles foi estar dentro de uma estrutura que eu achava não funcionar!
Com tantas vivências difíceis na minha trajetória eu era bastante cética em relação a algumas questões.
Sempre lutei para que as pessoas surdas estivessem dento da sociedade em igualdade de direitos, mas não acreditava que houvesse engajamento por parte de algumas instituições.
Mas, no ano de 2015 fui novamente presenteada e tive a oportunidade de encontrar muitas pessoas como eu, pessoas que lutam e acreditam!
Sou bem feliz por ter sido agraciada com esta oportunidade.