A história do Valmir, enquanto pai de um adulto com paralisia cerebral e totalmente dependente, representa algo do qual eu fugi desde o nascimento de Dora: uma vida trocando fraldas, carregando no colo, tirando e colocando na cadeira de rodas, e talvez até acamada. Encarar esse futuro é me sentir atrelado a minha filha, não pelo vínculo paterno, e sim pela certeza de sua dependência.
É bem provável que Dora não vá pedir para morar sozinha na cidade onde estudará. Não ficará em casa lendo alguma coisa enquanto Ana e eu vamos ao cinema. E a falta dessas realizações, se faz presente o capacitismo do qual eu tentava, em vão, me desvencilhar.
Julguei ter minha vida desperdiçada e minha paternidade anulada. Olhos alheios refletiam a imagem de um homem com uma capa de infelicidade autoimposta, onde estava bordada a pergunta "que vida é essa que nos espera?".
Ao evitar relatos como o do Valmir e ter como certeza apenas um porvir, pouco a pouco fui escapando de minha família. Era um movimento da inconsciência, muito apreciado por sua contraparte.
O futuro pode ser sim assustador, principalmente quando vivemos somente por ele. Talvez eu passe o resto de minha vida trocando minha filha, sem ouvir uma palavra sua. Mas se a vida me dá essa previsão, me resta transformar a tempestade em brisa.