Destaca-se a importância de
conhecer e compreender as necessidades e habilidades individuais de pessoas com
Transtorno do Espectro Autista (TEA), integrando seus hiperfocos no
desenvolvimento de estratégias metodológicas que melhorem seu desempenho
funcional, comportamental e de aprendizagem.
O hiperfoco é uma
característica distintiva do TEA. Trata-se de uma forma de hiperatividade
manifestada na atividade mental em vez da psicomotora, embora ambas possam
ocorrer simultaneamente. Por isso, muitas pessoas no espectro conseguem dominar
profundamente um assunto específico, pois a predisposição para o aprendizado se
combina com o interesse exclusivo em um único tema (Varella.2022).
Ainda de acordo com (Varella e
Orti, 2022):
Se o
hiperfoco em si é muito mais um estado mental do que uma condição e surge a
partir de interesses da pessoa do espectro autista, conforme ela se coloca ou é
colocada em contato com o objeto de interesse, mais vezes o estado de hiperfoco
pode ser ativado. É neste estado que o autista ‘dá o seu melhor’ em desempenho,
motivo pelo qual esses interesses costumam ser bem vistos e bem trabalhados
pelas famílias e profissionais de saúde, pois podem favorecer o desenvolvimento
de habilidades úteis para a vida diária.
Gostaria de destacar uma
autora que também aborda o conceito de hiperfoco em pessoas com autismo: Temple
Grandin. Ela é uma professora e escritora norte-americana, conhecida tanto por
suas contribuições no campo do autismo quanto por seu trabalho em ciência
animal. Em seus livros e palestras, Grandin compartilha amplamente suas
experiências pessoais com autismo, incluindo o hiperfoco, e discute como essa
característica pode ser utilizada como uma ferramenta para o desenvolvimento de
habilidades e talentos específicos. Seu livro "The Autistic Brain:
Thinking Across the Spectrum" ("O Cérebro Autista") explora
essas questões em profundidade, oferecendo insights valiosos sobre como o
hiperfoco pode ser direcionado de maneira positiva.
TRABALHANDO
COM HIPERFOCO NA PRÁTICA
Nos últimos anos, atuando como
professora especialista em autismo, precisei ampliar meus conhecimentos sobre
diversos assuntos. Um exemplo marcante foi quando, junto a um aluno, mergulhei
no universo dos dinossauros. Juntos, construímos uma história de vida em vídeo,
na qual ele se transformava no personagem "Pequeno Dinossauro Azul".
Este projeto foi inscrito em um festival de cinema promovido pela Diretoria de
Ensino e recebeu muitos destaques, incluindo uma menção honrosa da prefeitura
da nossa cidade.
Atualmente, continuo trabalhando com alunos que têm hiperfoco em dinossauros, assim como outros que possuem grandes dificuldades para ler e escrever, mas são experts em aplicativos e jogos digitais. Também há alunos com talento para criar e contar histórias, incluindo temas como pipas, desenhar capas de livros, interesse por focas, a personagem Ladybug e a história do Miraculous. Além disso, tenho um aluno com grande interesse na história econômica e social dos países, que adora desenhar memes em formato de bolas Polandball, mais conhecidas como Countryballs, uma representação humorística dos países do mundo.
A seguir, apresentamos alguns dos resultados em forma de relatos no desenvolvimento de situações de aprendizagem.
Descrição da atividade 01: O aluno desenhou a capa dos 17 livros da coleção "Diário de um Banana" à mão livre, ilustrando os personagens e as letras dos títulos dos livros. Foi identificado que, mesmo com dificuldades de escrita e leitura, o aluno consegue relacionar os títulos dos livros com os desenhos de cada capa (Figura 1).
Figura 1. Capas de livros
Descrição da Atividade 02: Atividade de escrita em linhas quadriculadas e cartas numeradas com os
personagens de Ladybug. A utilização das linhas quadriculadas auxilia o aluno
no desenvolvimento da coordenação motora fina, além de ajudar a organizar
melhor suas anotações e desenhos, facilitando a compreensão e visualização dos
conteúdos (Figura 2).
Figura 2. Personagens Ladybug
Essas habilidades podem ser
desenvolvidas de forma individual, compartilhada, oral, lúdica, exploratória,
interpretativa, crítica, criativa e interativa, ajustadas às necessidades
individuais de comportamento e de aprendizagem de cada aluna e aluno. Essa
abordagem pode ser aplicada a todos os alunos, sem exceção. “O trabalho de
escolarização das crianças com autismo exigirá dos professores uma reflexão
sobre os processos usuais de ensino e aprendizagem, bem como um olhar
diferente. Um olhar que leve em conta um estudante que não está em posição de
curiosidade, mas que aprende de maneira específica e pouco convencional”.
(DIVERSA, 2018)
Pessoas que, ao serem
estimuladas e desafiadas em situações que valorizam seus potenciais e
reconhecem seus gostos, interesses (hiperfocos), afinidades e curiosidades,
demonstram uma singularidade em sua forma de ser e viver. Pesquisas confirmam
que não há cura para o autismo, mas intervenções precoces e apropriadas podem
melhorar significativamente a qualidade de vida das pessoas com TEA.
O hiperfoco em pessoas com
autismo é um fenômeno complexo, que pode trazer tanto benefícios quanto
desafios. Com o apoio adequado e estratégias de manejo eficazes, é possível
maximizar os aspectos positivos do hiperfoco, contribuindo para uma vida
equilibrada e produtiva.
Referências:
PORTAL DRAUZIO VARELLA. Concentração intensa: conheça o hiperfoco e
como ele pode ser regulado. Disponível:https://drauziovarella.uol.com.br Acesso: 02 de jun.2024.
DIVERSA. Escrita e alfabetização de crianças com transtorno do espectro autista
(TEA). Disponível em: https://diversa.org.br/artigos/escrita-alfabetizacao-criancas-com-autismo/ Acesso: 14 de maio 2024.