Olá! Se não leu meu primeiro texto (Vida que segue...) postado anteriormente, provavelmente você ainda não me conhece, não tem problema, não se sinta um estranho! Só não fomos apresentados ainda!
Me chamo Nótlia Zirtaeb, mais uma mãe atípica que caiu de paraquedas nesse mundo "não" adaptado que é a vida!
Não sou escritora, nem jornalista ou pedagoga, não sou fisioterapeuta, nem fonoaudióloga ou terapeuta ocupacional, não sou farmacêutica, nem médica ou neurocientista, não sou nutricionista, nem nutróloga ou bioquímica... Não, não e não!!!
Percebe que foram 12 (há muito mais!) negações do que eu "não" sou!
Percebe que o negativo tem culturalmente um peso maior! (Os jornais que o digam!)
Se você, que não convive conosco, se depara com minha filha, logo vai perceber que há algo diferente com ela, e naturalmente, sem maldade alguma perguntará:
- Oi, desculpe perguntar, mas o que ela tem???
E eu, inconscientemente vou te dizer o que ela "não" tem! Parece estranho, mas é verdade! A provável resposta seria:
- Oi, ela "não" tem um diagnóstico fechado, o que sei até o momento que trata-se de uma paralisia cerebral causada por hipóxia devido a convulsões na UTI, logo seu cérebro "não" tem um desenvolvimento normal, e "não" há controle das convulsões até hoje por se tratar de uma epilepsia refratária de difícil controle, há também mutações genéticas que "não" foram ainda definidas a qual síndrome se encaixa, porque a geneticista ainda "não" concluiu os estudos, pois o diagnóstico anterior de Síndrome Kabuki tipo 2 "não" é compatível com sua clínica, logo ela foi descartada. Hoje ela "não" anda, "não" senta, "não" rola, "não" engatinha, na verdade "não" segura nem a cabeça, "não" fala, "não" ouve do lado direito, "não" acompanha com os olhos, "não" tem boa visão, "não" tem pressão palmar, ou seja "não" segura nada, "não" controla braços ou pernas, "não" pode ingerir nada que contenha leite por ser alérgica a proteína, "não" pode comer peixe porque vomita, "não" come nada sólido porque "não" mastiga. Ela "não" possui autonomia alguma, pois com excessão do sono e do xixi, para todo o restante ela necessita de apoio, inclusive para fazer o cocozinho, pois seu intestino "não" funciona direito e é necessário massagens e manobras para evacuar.
...uau!!!...vc deve estar pensando: "essa mãe deve estar vivendo um pesadelo!"
E mais uma vez a resposta é "NÃO"!
Sou uma mãe atípica, logo é necessário ter um pensamento e comportamento igualmente atípicos.
Estou ciente e consciente de sua deficiência (confesso que ainda me pego pensando como isso pode ter acontecido se a gestação e o parto normal de 40 semanas e 2 dias, foram perfeitos, e tanto eu quanto meu esposo éramos atletas e temos uma vida saudável, sem excessos, bem regrada...mas... não sei se um dia terei esta resposta).
Acredito que o segredo esteja no "foco", deixar de enxergar primeiro a deficiência para posteriormente ver o indivíduo.
Vamos refazer a pergunta anterior:
- Oi, desculpe a pergunta, mas o que ela tem?
Para alguém que já vive a 4 anos e 5 meses nesta rotina e de tanto colar e re-colar seus caquinhos, aprendeu na marra a mudar o foco para poder viver com maior qualidade de vida. E não pense que foi sempre assim, isso não acontece da noite para o dia, é um exercício diário. Então vejamos como ficaria a resposta:
- Oi, não tem por que se desculpar, você não fez nada de errado! Eu também tinha a mesma curiosidade quando via crianças diferentes em cadeira de rodas ou carrinhos adaptados, melhor perguntar do que tentar imaginar, não é mesmo?!
Esta é Cecília, diga oi minha filha!
(Obviamente ela não vai responder, então de uma forma animada e positiva completaria)...conta para essa tia(o) que você ainda está aprendendo a falar, andar, e a fazer todas as tarefas que uma garotinha linda, educada, obediente e gentil deve fazer, conta para a tia(o) que essa pequena lesãozinha (que de pequena não tem é nada!) na caixola (apontaria para a cabeça) não é pária para alguém forte como você, que dá um olé em muito marmanjo por aí.
E nessa hora, provavelmente, Cecília daria um genuíno sorriso que derrubaria qualquer resquício de preconceito!
Percebe a diferença! A criança continua a mesma da resposta anterior, mas a interlocutora do momento, eu, mostra o potencial dela, valoriza o que tem, e aponta para o futuro promissor que ela vai conquistar, seja hoje, amanhã, semana que vem, mês que vem ou a daqui 50 anos, não importa, nem eu, nem ela ou você sabemos o que pode acontecer no futuro.
Provavelmente, a pessoa que fez a pergunta, já entendeu que ela é uma criança amada, e que tem um problema na cabeça que a deixou assim, pronto, simples!
Mas e se a tia(o) for igual a mamãe que adora conversar, e então começar a fazer um monte de perguntas?
Ótimo!!! Significa que está interessada, e a pessoa geralmente só se interessa naquilo que lhe importa ou lhe agrada, então vamos aproveitar a brecha e mostrar que trata-se primeiro de uma criança e, segundo, com deficiência, nesta ordem...quem sabe esta pessoa não cria uma empatia e passe a disseminar a ideia de que não deve haver distinção, preconceito, exclusão e tantos outros substantivos já conhecidos!
Acredito que a mudança deva partir de dentro para fora.
Primeiro eu preciso encarar a vida, e a rotina atípica que me foi destinada de uma forma positiva e promissora, para só então poder esperar do outro (seja aquele que pergunta por curiosidade, ou aquele que vê e faz de conta que não vê), percebam que não há nada de errado, apenas um jeitinho diferente de viver a vida que é única e singular para cada indivíduo, seja ele típico ou atípico.
Lembre-se, o outro reage baseado no que ele vê em você...se está chorando pelo leite derramado, o outro sentirá pena... mas se você "foca" no que é positivo e bom, o outro sentirá admiração!
A decisão é sua!
Nótlia Zirtaeb