O processamento sensorial e sua importância para o desenvolvimento infantil
O desenvolvimento humano pode ser comparado a mais complexa obra da engenharia moderna vista nos últimos tempos. Em qualquer obra de construção é necessário investir matéria prima e tempo precioso para constituir sua base, ou seja, seu alicerce, o processamento das informações sensoriais (estímulos) pode ser comparado a este alicerce, que quando realizado de forma inadequada pode ruir e impactar toda a funcionamento da obra.
Desde que nascemos até morrermos o nosso Sistema Nervoso (S.N) necessita ser alimentado por informações sensoriais, pois estas o auxiliam em sua orientação em relação ao meio ambiente e ao que está acontecendo com o nosso corpo. Se por algum motivo o S.N for privado desses estímulos (informações) na fase inicial de sua vida pode comprometer seu funcionamento e gerar quadros de alterações no funcionamento das estruturas cerebrais.
De acordo com a pirâmide de aprendizado de Willians e Shellembergeer o processamento das informações dos sistemas sensoriais precedem toda e qualquer habilidade percepto motora, cognitivo e comportamental, pois ao nascer o S.N dedica seus primeiros meses apenas para se regular, sentir e organizar as informações sensoriais recebidas, para futuramente fazer uso delas para construir o alicerce do seu aprendizado e comportamento. (Williams, M.S. & Shellenberger 1996)
Segundo Jean Ayres, quando o cérebro processa estas sensações de forma eficaz, respostas adaptativas são geradas de modo que a pessoa consegue atuar em seu ambiente e manter uma rotina sem alterações e este processamento perdura por toda a sua vida. Todas as habilidades da criança, desde as comportamentais, emocionais e até acadêmicas, tem sua origem em uma base sensório motora. Grande parte da aprendizagem de uma criança está relacionada a sua habilidade de integrar informações sensoriais e estas associadas a atividade motora durante a infância. Estas experiências moldam as interconexões neurais para formar processos sensoriais e motores que permaneceram ao longo de toda a vida. (Ayres 2005)
Quando o processamento sensorial apresenta alguma alteração em seu funcionamento pode gerar uma desordem, definida como Ttranstorno de Processamento Sensorial (TPS). O TPS se apresenta como alteração na detecção, modulação, discriminação (interpretação) ou resposta ao estímulo sensorial, anteriormente descrita na literatura como disfunção de integração sensorial. O TPS é uma condição heterogênea que inclui uma variedade de subtipos. (Ben-sasson et al. 2007)
TRANSTORNO DO PROCESSAMENTO SENSORIAL E SEUS IMPACTOS NO DESEMPENHO OCUPACIONAL DAS CRIANÇAS.
O Transtorno de Processamento Sensorial (TPS) afeta 5-16% das crianças em idade escolar e pode causar déficits a longo prazo no desenvolvimento intelectual e social. As teorias atuais de TPS envolvem prejuízos nas áreas corticais sensoriais primárias e de ordem superior de integração multissensorial (MSI). (Ahn et al. 2004), (Ahn et al. 2004) (Owen et al. 2013)
O último estudo de revisão sistemática publicado em 2020 revelou ampla variação no processamento sensorial das crianças prematuras atípicas: 28% -87% envolvendo a modulação sensorial, 9% -70% no que se refere ao processamento somatossensorial ( sentido tátil e proprioceptivo) e 20% -70% no processamento motor de base sensorial (podendo ser os distúrbios posturais ou as dispraxias). Isso significa que essas crianças apresentaram risco elevado de distúrbio do processamento sensorial desde a infância até a idade escolar. A triagem de rotina do processamento sensorial, intervenção direcionadas e orientações aos pais devem ser consideradas como um suporte para melhorar o processamento sensorial e o desenvolvimento neurocognitivo dessas crianças (Niutanen et al. 2020).
A etiologia do TPS ainda é desconhecida, pois é difícil estudar precursores do desenvolvimento ou investigar substratos neurobiológicos em humanos. Uma possível via adicional de pesquisa está sendo a busca por modelos animais plausíveis e válidos, além disso, estudos genéticos e familiares fornecem uma janela para fatores etiológicos que contribuem para a expressão dos sintomas.
O TPS pode ser classificado conforme a imagem abaixo (Miller et al. 2007) :
SEGUE ABAIXO UMA LISTA PARA IDENTIFICAÇÃO DE POSSÍVEIS SINAIS DE DESORDEM NO PROCESSAMENTO SENSORIAL EM DIFERENTES FAIXAS ETÁRIAS,
VERIFICAÇÃO EM BEBÊS:
• O bebe apresenta problemas para comer;
• A criança se recusa a ir com qualquer pessoa além da mãe;
• A criança apresenta dificuldade para adormecer ou sustentar o sono;
• A criança se irrita extremamente nos momentos de troca de fralda ou roupa;
• A criança se irrita profundamente nos momentos de corte de unhas e cabelo;
• A criança dificilmente brinca com brinquedos, especialmente aqueles que exigem certa destreza;
• A criança recusa-se a engatinhar;
• A criança apresenta dificuldade em mudar o foco de um objeto, ou atividade para outro;
• A criança não percebe dor ou é lenta para gerar resposta quando se machuca;
• A criança resiste ao ser abraçada, afasta-se das pessoas que a tentam segurar;
• A criança não se acalma sugando a chupeta, olhando um brinquedo, sendo balançada ou ouvindo o som da voz da mãe;
• A criança tromba muito nos móveis e apresenta um corpo muito flexível;
• A criança se assusta facilmente com sons ou ruídos inesperados;
• A criança é muito ativa e constantemente move o corpo e membro sem parar;
• A criança atrasou para rastejar, engatinhar, ficar em pé, andar ou correr;
VERIFICAÇÃO EM CRIANÇAS EM IDADE PRÉ ESCOLAR:
• A criança tem dificuldade para sair da fralda;
• A criança é excessivamente sensível a estímulos diversos, reage ou não gosta de toque, ruído, cheiros, etc
• A criança não tem percepção quando é tocada, ao menos que seja feito com força ou intensidade extrema;
• A criança tem dificuldade para aprender e/ou evita realizar tarefas motoras finas (como usar giz de cera ou manipular prendedores na roupa, entre outros objetos pequenos);
• A criança parece não ter certeza de como mover seu corpo no espaço, é desajeitada e estranha;
• A criança tem dificuldade em aprender novas tarefas motoras;
• A criança está em constante movimento;
• A criança entra no espaço de todos e/ou toca tudo ao seu redor;
• A criança tem dificuldade em fazer amigos (excessivamente agressivo ou passivo em demasia (retira-se de situações sociais);
• A criança é intensa, exigente ou difícil de acalmar e tem dificuldade em situações de transições;
•
A criança sofre de mudanças repentinas de humor e crises de raiva inesperada;
• A criança parece fraca, cai quando está sentada, prefere atividades sedentárias;
• É difícil entender o discurso da criança;
• A criança parece não entender as instruções verbais.
IMPORTANTE LEMBRAR QUE UM ÚNICO COMPORTAMENTO OBSERVADO NÃO SIGNIFICA ALTERAÇÃO NO PROCESSAMENTO SENSORIAL, É PRECISO A SOMATÓRIO DE VÁRIOS DELES PARA SE FECHAR UM PADRÃO DE DISFUNÇÃO.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Ahn, Roianne R., Lucy Jane Miller, Sharon Milberger, and Daniel N. McIntosh. 2004. “Prevalence of Parents’ Perceptions of Sensory Processing Disorders among Kindergarten Children.” American Journal of Occupational Therapy 58(3):287–93.
Ayres, A. Jean. 2005. No TitleSensory Integration and the Child: 25th Anniversary Edition.
Ben-sasson, Ayelet, Sharon A. Cermak, Gael I. Orsmond, Helen Tager-flusberg, Alice S. Carter, Mary Beth Kadlec, and Winnie Dunn. 2007. “Extreme Sensory Modulation Behaviors in Toddlers.” Therapy 61(5):584–92.
Miller, Lucy Jane, Marie E. Anzalone, Shelly J. Lane, Sharon A. Cermak, and Elizabeth T. Osten. 2007. “Concept Evolution in Sensory Integration: A Proposed Nosology for Diagnosis.” American Journal of Occupational Therapy 61(2):135–42.
Niutanen, Ulla, Toini Harra, Aulikki Lano, and Marjo Metsäranta. 2020. “Systematic Review of Sensory Processing in Preterm Children Reveals Abnormal Sensory Modulation, Somatosensory Processing and Sensory-Based Motor Processing.” Acta Paediatrica, International Journal of Paediatrics 109(1):45–55.
Owen, Julia P., Elysa J. Marco, Shivani Desai, Emily Fourie, Julia Harris, Susanna S. Hill, Anne B. Arnett, and Pratik Mukherjee. 2013. “Abnormal White Matter Microstructure in Children with Sensory Processing Disorders.” NeuroImage: Clinical 2(1):844–53.
Williams, M.S. & Shellenberger, S. 1996. No Title“How Does Your Engine Run?” ® A Leader’s Guide to the Alert Program for Self-Regulation. edited by I. Albuquerque, NM: TherapyWorks.
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