Só cada um sabe como dói a sua dor, mas quem acompanhou de perto minha vida sabe que com a alegria da notícia de uma gravidez gemelar veio também a informação de que era de grande risco. "Transfusão feto-fetal".
Duas guerreiras lutavam pela vida já no meu ventre e eu lutava contra a angústia da incerteza sobre o futuro, cercada de preocupações e culpa por me sentir impotente em não poder fazer absolutamente nada naquele momento para ajudá-las.
Desde a primeira ecografia iniciamos uma rotina quase que diária para verificar o fluxo sanguíneo no cordão umbilical, com o medo de simplesmente ele zerar para uma das gêmeas. Já havíamos decidido que a gêmea menor se chamaria Camila e a maior se chamaria Letícia.
Enquanto Letícia se desenvolvia bem, sem saber que estava sugando os nutrientes da irmã, Camila lutava pela vida insistentemente chegando a fazer uma vaso-dilatação cerebral para enviar seus nutrientes apenas para os órgão vitais.
A Letícia estava bem dentro do ventre, precisava ficar... A Camila em sofrimento fetal, talvez teria mais chances se saísse para cuidarmos dela aqui.
Em um sábado, ao chegarmos em prantos do médico com o resultado de um exame nada favorável, Deus nos enviou um anjo chamado Rosana Luz (e que luz!), uma amiga, que percebendo a nossa angústia nos convidou para conhecer outro anjo chamado Pastor Nilson, o qual nos recebeu de braços abertos e nos acalmou não se importando com o horário de atendimento, não se importando com essa ou aquela religião. Pessoas que jamais conseguiremos esquecer, pois foram eles que nos mostraram o caminho da fé, algo que já havíamos perdido, ou que até então não sabíamos que existia.
Em 18 de fevereiro de 2010, com apenas 6 meses de gestação nasceram com cerca de 33cm Letícia com 1 quilo e Camila com apenas 900 gramas. Duas menininhas tão frágeis e pequenas que era possível ver todas as suas veias sob o corpinho.
Passaram por dificuldades, respirando apenas com respirador artificial, necessitaram diversas vezes de transfusão de sangue, às vezes duas na mesma madrugada. Deram alguns sustos com parada respiratória ou acelerando em demasiado o coraçãozinho bem diante de meus olhos. Perdiam peso ao invés de ganhar, chegando a pesar apenas 700 gramas. Ficaram quase 3 meses na UTI.
Foram tempos difíceis, de incertezas, de angústias, de permissão apenas para olhar 3 vezes ao dia, quando na verdade minha vontade era de levá-las para casa, tê-las em meus braços, acariciá-las e dizer: “Calma filha... tudo vai acabar bem!”
Todo este tempo de angústia foi acompanhado pelos meus anjos, que sempre me deram muita força e por tantas orações vindas de pessoas que eu nem conhecia.
Jamais esquecerei do único dia em que escolhi faltar a visita das 20 horas para aproveitar o grande público de uma igreja que eu nem frequentava para pedir doação de sangue para as minhas filhas. Preparei uma foto delas, na incubadora mesmo, salvei em um pendrive e pedi para o rapaz do som colocar no telão no momento que ele conseguisse. Minha surpresa foi enorme quando de repente iniciou o canto “Cura-me senhor Jesus”, e uma pastora pediu que todos esticassem os braços em direção ao hospital e que cantassem forte com muita fé.
Ninguém tem idéia de como aquele gesto foi importante para minhas meninas naquele momento!!! Até hoje as lágrimas caem ao lembrar deste momento.
Ao chegar pela manhã, tive a notícia de que quase perdemos a Camila, bem no horário da visita e nem mesmo a médica soube me responder o que houve e como ela sobreviveu.
E sim!!! Elas sobreviveram!!!
A cada dia que passa nossas guerreiras estão mais fortes, a Camila nos ensinando que o milagre existe, pois sobreviveu no ventre sem nenhum fluxo sanguíneo no cordão umbilical e hoje é uma garotinha esperta e arteira que ama muito a irmã.
Já a Letícia, costumo dizer que ela é uma heroína, pois mesmo super bem dentro do ventre, ao sair para proporcionar a chance da irmã sobreviver, ela acabou sofrendo com a falta de oxigênio, no entanto se supera a cada dia, me ensina muito com cada conquista e me inseriu neste mundo de inclusão.
E é por isso que há um tempo atrás idealizei o Projeto LIA - Lazer, Inclusão e Acessibilidade, criei junto a um amigo os brinquedos inclusivos móveis, faço parte da Associação Dar a Mão, sou integrante do GPRDR - Grupo de Doenças Raras do Paraná e hoje estou aqui na MUNDO ADAPTADO.
Sempre faço tudo com muito amor e tento transmitir esse amor ao próximo. Jamais deixarei ser em vão tudo que minhas meninas passaram e toda a ajuda que tive.
OBRIGADA minhas guerreiras por existirem em minha vida e agradeço a Mundo Adaptado por permitir que eu conte essa história.